domingo, 28 de outubro de 2007

Produto de um Jogo Surrealista de Entretenimento

Era uma tarde fria no inferno, eu não tinha nada além da minha cartola e um encarte de vinil do Dark Side of the Moon, que coloquei sob uma lareira e tudo então foi ficando quente, e virando céu. Lembrei-me de um céu que já não existe mais, o de nuvens pálidas que hoje estão cinzas da fumaça que sai a cada piscar de olhos do meu cachorro. Foi então que, sem céu nem inferno pra habitar, caí, caí, caí... até mergulhar numa coisa líquida, viscosa e antiga.
Para esquecer o que realmente eu não tinha, fui me misturando a esse licor que descia pelo ralo da pia e do sangue umbilical me desvinculei, posto que era dia. Comi uma maçã que tinha mais gosto de pena que de carne, peguei meu guarda-chuva para atirar folhas secas no banco de arquitetura mal feita, tão bela quanto minha mão quando fica roxa.
Reuni todas as minhas forças e toda minha coragem, e gritei a única palavra que nunca tinha ousado dizer durante todo esse tempo: colher! E há tempos não grito flores, do mesmo modo que não entrego flores ao tempo. Que se crie um laço entre o tempo e a flor, e continuarei gritando.
Devo pular ou me empurrem então, tão direto do chão ao salgueiro. Dançarei minúcias e reminiscências naquele sombrio solar de escadas rolantes, pérolas fruta-cor comestíveis. Um coração parasita a me guiar pelo algodão denso de chumbo e serragem, no país das dores da paz.


(Por Bruno Ferreto, Daniel Faiad e Lidiane Ester)